quinta-feira, 17 de junho de 2010

E continuou a chuva. Mas agora as gotas mudaram o seu gosto. Eram gotas de gostos novos. E de olhos novos. Abriu os olhos e estranhou. Não sabia se era a chuva, as gotas, o gosto ou os tais olhos. Mas estranhou. Mesmo assim, levantou. O caminho era o mesmo de sempre, a avenida tão movimentada quanto ontem. E as lágrimas da chuva continuavam a animá-la. Procurou encontrar o que de diferente se escondia naquele cenário tão próprio de seus textos e histórias.

Era como se acordasse de um sonho. E, ao abrir os olhos, encontrava menos. Menos motivos, menos motivações. Menos por-vir. Sentia-se flutuando, de nuvem em nuvem - ou gota em gota - no futuro. Acordara de um sonho, no futuro. E, apesar da chuva, as suas gotas tinham um gosto novo. E gotas-gosto-olhos-nuvens a faziam estranhar. Como é que era agora, no futuro? Entusiasmo e desilusões a arrebatavam. E o tédio gotejava, junto com a chuva-a-gosto. Tira gosto.

Fotografias e negativos passavam pela sua cabeça: "Eu não quero ser uma formiga", "Eu amo isso, sei que é o que eu quero fazer da minha vida". Pronto, fizera a faculdade. Seguira o teatro. Mas... e agora? Qual a sua garantia de não ser uma formiga? Qual o sabor do gosto das gotas para as formigas? Qual o sabor da vontade para as formigas? E o sabor do tédio? Sentia um formigamento nos membros. Uma voz lhe insistia: e agora?

E agora? As gotas não tinham mais o gosto de promessa. De espectativa, de antes. Elas tinham o gosto do depois.

E em meio as gotas-gosto de chuva, decidiu que tinha que inventar um novo futuro.

(início de 2009)

Um comentário:

  1. Engraçado ver a diferença entre as duas natashas desses textos. Principalmente no que diz respeito à ingenuidade... Quanta vida! Nada mais que uma faculdade. Ou nada como uma faculdade. Definitivamente hoje gosto mais do segundo.

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