sábado, 10 de setembro de 2011

A recepcionista (uma de nossas mulheres)




O relógio apita: são seis horas da manhã. “Droga”, ela pensa, “só mais cinco minutos”. Ah! Esses famosos cinco minutos. E mais cinco, e mais cinco. Meio em transe, dorme e acorda, até que se assusta: “Já está tarde”. Durante o café da manhã, lê o jornal. Lê as primeiras notícias, mas se engasga na matéria cobre maneiras de investir o seu tempo. É melhor apressar-se. Escova os dentes e cospe a espuma, como se cuspisse junto com ela, seu sono.
Se arruma, se apruma, se veste. E guarda seus sonhos e suas vontades lá numa gavetinha escondida dentro de si. Se prende no uniforme. E assim, inicia mais um dia de trabalho. Digita, o telefone toca algumas vezes. E inventa mil desculpas ao telefone, porque o seu chefe está lá dentro e não quer ser incomodado. Talvez esteja lendo o jornal, jogando paciência. Ou... quem sabe esteja com a Ritinha. Acha que é melhor não conjecturar muito. Volta ao trabalho.
Um e-mail inesperado. Fica feliz. Será que usa aquela lingerie? Ah! Esse maldito telefone: “Alô, me desculpe, o Sr. Alberto está em reunião, anoto o seu nome e ele já te retorna”. Será que usar a lingerie, deitar-se com ele assim de primeira, é se oferecer muito? “Porra, cadê a Marcinha que não entra no msn?”
Chega o seu Alfredo, “Aquele chato”. Vamos lá, recepcioná-lo. Paradoxalmente, é obrigada a se oferecer para ele, oferecer seu melhor sorriso, sua simpatia (o que é quase como ter que oferecer o seu corpo todo). E ele lá, com as mesmas gracinhas de sempre. “Velho chato”.
Finalmente ele se foi. “Só” faltam mais cinco horas de trabalho e o escritório está tão calmo. Tantos relatórios, e-mails. E assim, um marasmo lhe assoma, um cansaço daquilo tão feito, refeito, repetido. Lentamente, digita até cair no sono.

(texto de um processo que conta com Fernanda Moreno e Flávia Coelho)

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